A nova forma de litigar das empresas no Novo Código de Processo Civil.
A nova forma de litigar das empresas no Novo Código de Processo Civil
Leonardo Falcão Ribeiro. Doutorando em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC.
E-mail: leonardo.falcao23@gmail.com ORCID: https://orcid.org/0009-0006-8553-6067
Celular: (71) 99140-9999.
Resumo
O processo civil no Brasil, ao longo dos anos, passou por fortes transformações saindo de um sistema mais arcaico, onde a busca pelo Poder Judiciário restringia-se a casos mais simples e o qual poucas pessoas possuíam acesso, até os tempos atuais, onde as complexas relações sociais, conjugadas com o avança tecnológico e as diversas legislações existentes eclodiram numa grande demanda judicial para resolução dos conflitos. Isso fez abarrotar a justiça com diversos tipos de necessidades e diferentes níveis de complexidade, ensejando numa busca maior por especialização. Ocorre que, mesmo com aumento do número de servidores, juízes, comarcas, especialização das matérias, etc. tudo isso em conjunto não foi suficiente para enfrentar o crescente número de processos, que ano após ano, chega-se ao judiciário. O número de novas lides comparativamente ao número de encerramentos, num mesmo período era sempre positivo, ou seja, o estoque de processos para serem analisados pelo Poder Judiciário aumenta ano após ano. Isso influi diretamente na prestação de serviço, na imagem do Poder e em última instância nos objetivos essenciais da existência de um órgão de resolução de conflitos. Tudo isso em conjunto fez com que se buscasse, cada vez mais, aperfeiçoar o sistema de processo brasileiro e com isso surgiu o Novo Código de Processo Civil, datado de 16 de março de 2015, tendo sua entrada em vigor 1 anos após. O NCPC, como é conhecido, introduziu diversas diferenças em relação ao regime jurídico processual existente, que datava de 1973. O presente artigo é divido em três partes. A primeira parte é a introdução e trata-se de um escorço histórico do Processo Civil no Brasil, abordando suas origens até atingir o NCPC. O segundo capítulo aborda características do Código de Processo Civil de 2015, destacando diferenças entre o referido código e seu anterior. O derradeiro capítulo versa sobre a nova forma de litigar das empresas, baseado em dados do CNJ. A conclusão debate o panorama geral e quais os principais fatores que permitiram as empresa mudarem de posicionamento na hora de litigar. O método aplicado será o dialético, buscando confrontar teses opostas, gerando respostas com profundidade e a devida maturidade, o que garantirá a criticidade ao documento.
Palavras-Chave: Processo Civil. Litigância. Custo do processo.
The new way of litigating companies in the New Code of Civil Procedure
Abstract
The civil procedure in Brazil, over the years, underwent strong transformations, leaving a more archaic system, where the search for the Judiciary was restricted to simpler cases and which few people had access to, until the present time, where the complex social relations, combined with technological advances and the various existing legislations, have resulted in a large judicial demand for conflict resolution. This cluttered justice with different types of needs and different levels of complexity, leading to a greater search for specialization. It happens that, even with the increase in the number of civil servants, judges, districts, specialization of subjects, etc. all this together was not enough to face the growing number of lawsuits, which year after year, arrive at the judiciary. The number of new lawsuits compared to the number of closures, in the same period was always positive, that is, the stock of cases to be analyzed by the Judiciary increases year after year. This directly influences the provision of services, the image of Power and, ultimately, the essential objectives of the existence of a dispute resolution body. All of this together led to an ever-increasing search to improve the Brazilian procedural system and with that came the New Code of Civil Procedure, dated March 16, 2015, which entered into force 1 year later. The NCPC, as it is known, introduced several differences in relation to the existing procedural legal regime, which dated from 1973. This article is divided into three parts. The first part is the introduction and it is a historical foreshortening of the Civil Procedure in Brazil, approaching its origins until reaching the NCPC. The second chapter discusses characteristics of the Civil Procedure Code of 2015, highlighting differences between the aforementioned code and its predecessor. The final chapter deals with the new way of litigating companies, based on data from the CNJ. The conclusion discusses the general panorama and the main factors that allowed the companies to change their position when it came to litigating. The applied method will be dialectical, seeking to confront opposing theses, generating answers with depth and due maturity, which will guarantee the criticality of the document.
Key words: Civil Procedure. Litigation. Process cost.
1. INTRODUÇÃO
O processo civil brasileiro se construiu basicamente após a independência do país da coroa portuguesa, isto porque, antes de 1822 toda a legislação sobre a matéria advinha de Portugal que a impunha ao Brasil como força de lei, já que este era colônia portuguesa. Com a independência, o Brasil deixou de estar totalmente subjugado aos mandamentos da metrópole e passou a seguir de forma solitária.
Ocorre que neste período o território nacional já era extremamente vasto e a sua sociedade era formada por membros de diferentes localidades, culturas, ideologias, etc. o que ensejou em forte influência na sua formação jurídica, já que era necessário adequar essa diversidade cultural e social a mudança política recentemente ocorrida. Nisto viu-se eclodir diferentes domínios na formação jurídica nacional. A colônia portuguesa, que de forma incipiente tornara-se um país independente, bebeu das ideias anglo-saxão na sua formação político-constitucional, mas manteve fiel as características européias no que atinge ao direto processual.
A confirmação da influência americana na formação político-constitucional brasileira é perceptível na Constituição do Império de 1824, que em diversas passagens remete a estruturação constitucional similar aos Estados Unidos da América. Outra questão de destaque é que, enquanto com a independência viu-se surgir, quase que de forma imediata, um novo regime constitucional e logo em seguida um regime processual penal, somente em 1850 é que surge a ideia de um código de processo civil, deixando por longo tempo prevalecer a legislação do Livro Terceiro das Ordenações Filipinas.
Em 1850 é editado o Regulamento 737 que teve como objetivo melhorar o processo comercial da época, já que até aquele momento, ainda permanecia inalterado seguindo os regramento do processo comum previsto na Ordenação Filipinas. Pode-se dizer que foi a gênese do Código de Processo Civil, ainda que somente aplicável ao processo comercial, foi um passo importante para um legislação totalmente nacional, já que simplificou e aclarou uma série de regras ao se utilizar de uma técnica legislativa mais moderna. Todavia, para as outras questões permaneceu aplicável as regras estabelecidas pelas Ordenações Filipinas, que só sairia de uso no século XX, destacando o longo tempo de sua aplicação no território nacional, mesmo após a independência.
Em 15 de novembro de 1889 é proclamada a República no Brasil e com esse evento histórico surge também um novo texto constitucional, em substituição ao carta de 1824, mais moderno, mas ainda com forte influência ingleses. Nesta nova constituição, dois pontos, com relação ao processo civil, merecem destaques: o primeiro foi a extensão do Regulamento 737 ao processo civil como um todo e o segundo foi a possibilidade dada aos Estados-Membros de legislarem em matéria de processo civil. Nisso viu-se surgir os Códigos de Processo Civil do estado do Pará em 1904, São Paulo, Espírito Santo e Paraíba em 1930. Concomitante a este período surgiu o Código Civil Brasileiro de 1916 e que perdurou até 2002.
Impende frisar que até 1939 subsistiu no Brasil um código único de direito material e diversas legislações esparsas de direito processual. Em 1939, surge o primeiro Código de Processo Civil do Brasil, único para ser aplicável em todo território nacional e sofrendo forte influência das tendências mais modernas do direito processual civil europeu. Destarte, considerou-se, com grande destaque, as tendências da Civilprozessordnung austríaca de 1895, o Projeto Chiovenda de 1919 e o Código de processo civil português de 1926. Assim, no Brasil, em combate à concepção liberal de processo, implementava-se uma intervenção ativa do Estado no processo, mediante a formulação de um papel ativo do juiz.
1.1 Código de Processo Civil de 1939
Teve sua gênese numa Comissão instituída pelo Ministro da Justiça para Elaboração do Projeto de Código de Processo Civil, contudo devido a problemas internos, que bloqueou atividades conjuntas, Pedro Batista Martins apresentou, solitariamente, um Anteprojeto ao Ministro Francisco Campos, que, após revisão, mediante longa Exposição de Motivos, o encaminhou ao Presidente da República.
Em 18 de setembro de 1939 foi promulgado o Decreto-Lei nº 1.608 que institui o Código de Processo Civil. Na época a grande preocupação do legislador estava vinculado ao acesso a justiça e com a efetividade do processo. É possível identificar tal preocupação na própria exposição de motivos do código.
O CPC/39 apresentou importantes características como ser um código uniforme, estar vinculado com o direito processual civil europeu, ter sofrido influência austríaca, alemã e portuguesa. Dentre todas as características do Código de 1939, talvez a maior seja o fato de esse afeiçoar-se, com algumas concessões - à técnica da oralidade, à época, uma tendência mundial. Aquela Exposição de Motivos então mostrava as vantagens daquele sistema em que o juiz colhe as suas impressões pessoais, destacando os benefícios da aplicação dos princípios da concentração e da identidade física.
Foi um código dividido em dez livros e possuindo 1.052 artigos. Os seus livros eram a) Disposições gerais (arts. 1º a 152); b) Do processo em geral (arts. 153 a 290); c) Do processo ordinário (arts. 291 a 297); d) Dos processos especiais (arts. 298 a 674); e) Dos processos acessórios (arts. 675 a 781); f) Dos processos da competência originária dos Tribunais (arts. 782 a 807) ; g) Dos recursos (arts. 808 a 881); h) Da execução (arts. 882 a 1.030); i) Do juízo arbitral (arts. 1.031 a 1.035); j) Disposições finais e transitórias
O Código Civil de 1939, apesar de iniciar um regime próprio e consolidado de uma legislação processual no Brasil, mudando do Livro Terceiro das Ordenação Filipinas para um texto genuinamente nacional, foi amplamente criticado por causa da terminologia e atecnicidade das expressões utilizadas, o que desembocou, em 1973 na adoção de um novo regime processual no Brasil.
1.2 Código de Processo Civil de 1973
A década agora é 1970 e a realidade mudou significativamente após a 2ª Grande Guerra, onde a continuidade com um processo civil nos moldes como de 1939 era inviável, visto que, as sucessivas críticas aliadas a expediência de mais de 30 ano de vigência, estamparam as vicissitudes de um sistema processual de baixa tecnicidade, inúmeros vícios e defeitos e com uma forte tendência autoritária, decorrente do crescente poder inquisitório do juiz. É nesse contexto e em decorrência da evolução social e a necessidade de adequar o sistemas de normas, surge o Código de Processo Civil de 1973.
O anteprojeto foi desenvolvido por Alfredo Buzaid (Ministro da Justiça) que sofreu forte influência dos estudos de Liebman. Esse mesmo texto possui diversas disposições inspiradas em textos estrangeiros como as leis alemães, austríaca, italiana, francesa e portuguesa. Evidenciou-se também um forte paralelismo com Código de Processo Civil do Estado Cidade do Vaticano.
Impende frisar que o Código de Processo Civil de 1973 foi consubstanciado numa excelência técnica e tentativa de neutralidade ideológica, mas, ao mesmo tempo, não chegou a ofuscar o caráter eminentemente ideológico de alguns institutos. O mesmo código possuía como principais características a vinculação com o direito processual civil europeu e foi formatado em 1.220 artigos, com um agravante de excesso de “mini-reformas”.
Ocorre que o passar dos anos demonstrou que a suposta excelência técnica da gênese do seu surgimento, não se comprovou na prática, visto que foi ineficiente para lidar com os problemas pragmáticos, em face de diversos déficits operacionais e administrativos do Poder Judiciário brasileiro, sem olvidar o aumento da complexidade normativa que se produziu ao longo de poucas décadas.
Isso desembocou na necessidade de mais uma nova reforma processual no Brasil, que efetivamente só veio a ocorrer 42 anos depois, mas que antes desse período tiveram diversas mini-reformas que posteriormente seriam incorporadas definitivamente no NCPC de 2015.
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
Em 2009 devido a evolução social e também o advento da internet combinada com a perda de capacidade do CPC/73 de atender as carências sociais e resolver os inúmeros problemas do Poder Judiciário surge a necessidade de uma nova reforma do Código de Processo Civil.
Apesar de ainda vigorar a discussão de que a melhoria do sistema processual brasileiro poderia ser levada a frente mediante a simples alteração legislativa do código existente, é importante pontuar que neste momento já se identificava que as pequenas alterações já não mais faziam frente as indigências sociais, necessitando-se, assim, de um novo Código de Processo Civil. Isso ocorreu porque as excessivas mini-reforma ao invés de resolver o problema, acabaram por piorá-lo a medida que as legislações processuais tornaram-se desconexas e sem coesão interna, o que dificulta a compreensão pelos próprios operadores do direito, potencializando a complexidade processual.
A Comissão de juristas, encabeçada pelo então Ministro do Superior Tribunal de Justiça na época - Ministro Luiz Fuz, teve a finalidade de apresentar, no prazo de cento e oitenta dias, anteprojeto de Código de Processo Civil ao Senado Brasileiro e foi criada mediante o ato n. 379, de 30 de setembro de 2009, sendo composta por: Adroaldo Furtado Fabricio, Bruno Dantas, Benedito Cerezzo Pereira Filho, Elpídio Donizetti, Teresa Arruda Alvim Wambier (Relatora do projeto), Humberto Theodoro Júnior, Paulo Cezar Pinheiro Carneiro, Luiz Fux (Presidente da Comissão – e agora Ministro do Supremo Tribunal Federal), Jansen Fialho de Almeida, José Miguel Garcia Medina, José Roberto dos Santos Bedaque, Marcus Vinicius Furtado Coelho.
Esse processo legislativo tramitou durante, aproximadamente, 5 longos anos e na Exposição de Motivos ficaram claros os 5 pilares básicos do Novo Código de Processo Civil, quais sejam: 1) estabelecer expressa e implicitamente verdadeira sintonia fina com a Constituição Federal; 2) criar condições para que o juiz possa proferir decisão de forma mais rente à realidade fática subjacente à causa; 3) simplificar, resolvendo problemas e reduzindo a complexidade de subsistemas, como, por exemplo, o recursal; 4) dar todo o rendimento possível a cada processo em si mesmo considerado; e 5) imprimir maior grau de organicidade ao sistema, dando-lhe, assim, mais coesão.
O NCPC/15 eclodiu com diversas características principais. No Livro I surgiu a tentativa de imprimir uma efetiva constitucionalização do direito processual; uma maior adoção da perspectiva democrática do princípio do contraditório e a possibilidade de concessão de uma liminar satisfativa (sem força de coisa julgada). No Livro II viu-se surgir uma reestruturação da cognição acabando com a dicotomia procedimento sumário e ordinário; um grande incentivo a conciliação e mediação e a redução das hipóteses de procedimentos especiais.
Em relação ao Livro IV observou-se significativa alterações nos vários aspectos das impugnações, notadamente, as decisões interlocutórias que não seriam sujeitas a agravo (retirada de seu efeito preclusivo), mas, em hipóteses de urgência e em outras casuisticamente previstas, caberá o agravo por instrumento (ocorre extinção do recurso em sua modalidade retida). Inovou-se no incidente de resolução de demandas repetitivas e observou-se um fortalecimento da jurisprudência e padronização decisória.
No que tange aos aspectos polêmicos, o NCPC apresentou as situações diversas do que ocorria anteriormente. Assim, no Código Civil de 1973 as decisões interlocutórias não impugnadas pelo recurso de Agravo (retido ou de instrumento) precluiam. Para o recurso ser apresentando diretamente ao Tribunal deveria se demonstrar o grau de relevância da decisão ou se tratar de uma hipótese que a lei ou o sistema autorizem. Como existiam muitos recurso de agravo de instrumento, numa das minirreformas do CPC/73, ficou-se estabelecido a possibilidade do Juiz relator no Tribunal converter o agravo de instrumento, de análise imediata, em agravo retido, com análise futura juntamente com a apelação. No novo CPC extingue-se o agravo retido e as questões debatidas na fase de cognição, se não abarcadas pelo agravo de instrumento, não sofrem mais o efeito da preclusão. A referida proposta comporta pelo menos dois problemas: o primeiro é que o rol casuístico previsto no art. 1.015 do CPC não abarca todas as hipóteses que viabilizarão a anulação da sentença, pela não análise da matéria no curso do processo, criando idas e vindas do procedimento; o segundo é que o projeto não diminuirá o número de agravos de instrumento em tramitação nos tribunais, eis que estatisticamente o grande percentual desses recursos versam sobre decisões interlocutórias de concessão ou denegação de tutelas de urgência, hipótese mantida, pelo projeto para cabimento do Agravo de Instrumento.
Outra controvérsia do NCPC foi a ampliação das técnicas de padronização decisória para resolução da questão da litigiosidade repetitiva. No sistema de 1973, a adoção de padrões decisórios liminares ou de padrões pelos tribunais superiores vinha gerando uma profusão numérica de julgamentos de casos idênticos, apesar de todas as discussões acerca de sua legitimidade. No NCPC a utilização dessas técnicas é mantida e ampliada.
A aludida técnica mantém a possibilidade de julgamento sem oitiva do réu em hipóteses nas quais já exista entendimento modelar dos tribunais superiores acerca da matéria, mas sem permitir técnicas de diferenciação de casos com alguma nuança diversa.
O NCPC tenta produzir uma cultura da utilização dos precedentes, com a mantença das técnicas de repercussão geral e recurso especial repetitivo.
O grande problema está que o incidente projetado no Brasil não delineia a figura dos litigantes padrão, e permite a participação de todos os interessados diretamente, inclusive viabilizando a sustentação oral de todos no Tribunal pelo prazo único de 30 minutos a ser dividido por todos. O problema existe, que caso abra-se a possibilidade de participação de todos os interessados, que na prática podem chegar aos milhares de cidadãos, dificilmente o incidente poderá ser julgado no prazo indicado de 6 meses, de modo a viabilizar a aplicação das especificidades pelos juízos de primeiro grau.
Avaliando as principais mudanças que o NCPC introduziu no sistema processual brasileiro observou-se o surgimento do contraditório prévio, a vedação a decisão surpresa e a obrigatoriedade de fundamentar as decisões. Nos artigos 9º, 10 e 489, §1º, o Código de Processo Civil de 2015 é trazido de forma expressa e específica temas como o direito ao contraditório prévio e o dever (obrigação) de fundamentação das decisões judiciais. Outra importante mudança foi na forma de resolução de conflitos através de meios alternativos, assim como os negócios processuais e calendário processual e isso se deu mediante a criação de mecanismos alternativos de resolução de conflitos como a conciliação, mediação e a arbitragem. Ademais, em situação no qual as partes são capazes foi instituído o negócio processual (art. 190) e o calendário processual (art. 191) que é a possibilidade de o juiz e as partes podem fixar calendário para a prática dos atos processuais, quando for o caso.
O NPCP ainda trouxe as transmutações vinculadas a ordem preferencial de julgamentos dos processos, isso se deu por uma intervenção substancial no novo Código de Processo Civil no art. 12, que prevê o julgamento em ordem cronológica dos processos, onde informa que os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Ademais, um outra importante modificação foi na forma de contagem de prazos processuais em dias úteis e a suspensão dos prazos, também conhecido como férias dos Advogados. Essa demanda foi excessivamente buscada pela carreira jurídica, notadamente os advogados, já que inexistia previsão no ordenamento jurídico anterior e com a conquista passou-se a contar os prazos processuais em dias úteis. Ademais foi instituído o recesso forense no mês de dezembro.
Outra metamorfose do NCPC em relação ao CPC/73 versou sobre os meios de Defesa do Réu adotando o sincretismo processual, isso significou que cabe ao Réu agora apresentar seus meios de defesa e reconvenção em uma única petição, sob pena de não o fazendo, ocorrer a preclusão. Os meios de defesas que no Código de Processo Civil eram feitos de forma individualizada, agora podem ser todos apresentados como preliminares na contestação.
Tem-se ainda que ocorrer no NCPC a unificação dos prazos recursais, significando que, excetuados os embargos de declaração, todos os prazos recusais passaram a ter o período definido de 15 (quinze) dias úteis. Ocorreu também modificação na majoração de honorários nas fases recursais. Previsto expressamente no art. 85, §11º os honorários deverão ser majorados, levando em conta o trabalho adicional do advogado.
Todos os aspectos alterados no NCPC serviu para a existência de um sistema processual mais moderno, célere e direcionado a resolução dos conflitos sociais e isso provocou uma verdadeira guinada na forma das pessoas e empresas de litigarem no Poder Judiciário, observando mais os aspectos vinculados a análise econômica do direito em detrimento da análise exclusiva do direito.
A NOVA FORMA DE LITIGAR DAS EMPRESAS
Um ponto de destaque do presente trabalho é que muitas empresas mudaram a configuração de como lidar com os processos judiciais. O que antes do Código Processo Civil de 2015 era uma prática comum, qual seja, a adoção de recursos intermináveis no processo. Após o Novo Código tomou contornos diferentes e dois aspectos primordiais devem ser considerados para essa questão: 1) incentivos das práticas conciliatórias; e 2) custo do processo na justiça ao longo do tempo.
O custo do processo na justiça representa um verdadeiro trade-off para as empresas, visto que, a análise econômica do caso está vinculada a manter um processo na justiça, utilizando de todos os mecanismos recursais cabíveis e ao final ter um desfecho desfavorável adimplindo valores maiores ou somente utilizar os recursos nos casos que, efetivamente, exista uma chance razoável de vitória.
Na seara do Processo Civil com base no CPC/73 está análise econômica estava mais consubstanciada na prorrogação indefinita dos processos, visto que, os custos ao longo do tempo, apesar de evoluírem, não eram excessivamente expressivos.
Com o advento do Novo Código de Processo Civil, os custos do processos judiciais passaram a apresentar-se significativos evoluções, seja em decorrência da possibilidade de majoração dos honorários, seja em virtude das atualização das condenação. Desta forma, as empresas, após uma verdadeira análise econômica do processo, perceberam que a manutenção de processos na justiça era mais prejudicial do que a realização de um acordo, obviamente atentando-se para as questões da possibilidade de criação de precedentes.
Assim, na empresa Caixa Econômica Federal, por exemplo, a prática de acordo (conciliar) aliada a política nacional de conciliação da Justiça Federal fez aumentar uma prática, que nos termos do Código de Processo Civil anterior, não era tão difundida.
Para se ter uma dimensão da realidade da justiça brasileira nos moldes do NCPC é apresentado diversos dados colhidos do Conselho Nacional de Justiça. Os referidos dados demonstram índices de conciliação por diferentes tipos de justiça, tempo de duração dos processo e o custos dos referidos processo. Evidentemente que existem outras variáveis aplicáveis a análise do questão colocada em pauta, mas seguramente essas três variáveis são as mais impactante na tomada de decisão das empresas, o que ensejou na alteração da forma de litigar.
Dados da Justiça do Brasil antes e depois do NCPC
Conciliação
Uma das questões cruciais advindas com o Novo Código de Processo Civil foi a implementação da necessidade de audiência prévia de conciliação, bem como o incentivo a métodos alternativos de solução de conflitos e isso fez majorar tanto os índices de conciliações realizadas, como o próprio números de CEJUSC instalados.
Figura 1 - Índice de Conciliação
A figura acima traz o percentual de sentenças homologatórias de acordo, comparativamente ao total de sentenças e decisões terminativas proferidas. Em 2021, foram 11,9% sentenças homologatórias de acordo proferidas, valor que registrou crescimento em relação ao ano anterior, muito embora ainda não tenha retornado aos patamares que eram verificados antes da pandemia causada pela Covid-19. Na fase de execução, as sentenças homologatórias de acordo corresponderam, em 2021, a 8,1%. É notória a curva de crescimento, tendo dobrado o valor ao longo da série histórica, com aumento em 4,6 pontos percentuais entre os anos de 2015 e 2021. Tal resultado pode decorrer do incentivo do CNJ para realizar conciliação na fase de execução, tendo sido um destaque na XVI Semana Nacional de Conciliação realizada (ano 2021). Na fase de conhecimento, a conciliação foi de 17,4%, um pouco acima (0,8 ponto percentual) do observado em 2020.
Figura 2, 3 e 4 - Índice de Conciliação, por Tribunal ano 2021
Figura 2 - Justiça Federal
Figura 3 - Justiça Estadual
Figura 4 - Justiça do Trabalho
Importante destacar que os dados acima referem-se a conjunção e todas as justiças: federais, estaduais e trabalhista. Ademais a justiça com os maiores índices de acordo está na Justiça do Trabalho, com percentual médio de 20,5%, seguido da Justiça Estadual com índice médio de 11,5% e por fim a justiça federal, com índice médio de 9,3%.
No caso em específico da Justiça do Trabalho o percentual aumenta para 33% quando apenas a fase de conhecimento de primeiro grau é considerada. E o TRT mais eficiente nesta fase é o TRT6 (Pernambuco) com um percentual de 47% de resolução dos conflitos através da conciliação.
Alguns pontos interessantes. O primeiro grau de jurisdição sempre fazem um percentual de acordos muito maior que o segundo grau de jurisdição, em todos os tribunais. Da mesma forma, os processos em fase de conhecimento apresentam índices de acordo muito maiores do que os processos em fase de execução. Por fim e não menos importante, os processos em sede de juizado apresentam um percentual de acordo de até 15 vezes mais que o da justiça comum, notadamente na Justiça Federal.
Figura 5 - Índice de conciliação na fase de conhecimento do primeiro grau no juízo comum e nos juizados especiais, justiça Estadual
Figura 6 - Índice de conciliação na fase de conhecimento do primeiro grau no juízo comum e nos juizados especiais, justiça federal
Tempo de Duração do Processo
O tempo de duração do processo combinado com o custo do processo no tempo é um importante indicador para as empresas efetivarem suas análise econômicas da forma de condução do seu acervo, isto porque, quanto mais longo um processo, mais custoso ele será para as empresas, seja porque as condenações devem ser atualizadas e corrigidas monetariamente, seja porque terá maiores custos com advogados, sistemas, etc. ao longo deste mesmo período.
Para o ano de 2021, o tempo médio de duração dos processos na fase de conhecimento, nas 3 justiças era de 1 ano e 4 meses até a sentença e quase de 1 ano e 10 meses até a baixa, sendo que a Justiça do Trabalho apresentava o menor tempo médio, qual seja, 9 meses até a sentença e e 14 meses até a baixa, enquanto que a justiça estadual levava quase 2 anos até a sentença e mais de 2 anos e meio até a baixa. Impende frisar ainda que esse tempo médio é da Justiça comum, não sendo contemplado os Juizados Especiais que será analisar separadamente.
Uma outro ponto interessante é que o tempo médio da fase de execução é bem superior ao tempo médio da fase de conhecimento. Na fase de execução o tempo médio fica em torno de 4 anos e 8 meses até a sentença e 4 anos e 9 meses até a abaixa.
Figura 7 - Tempo de Duração do Processo nas Varas Estaduais, Federais e do Trabalho, tanto na fase Conhecimento como na Fase de Execução
Quando se analisa os Juizados Especiais em comparativo com a Justiça Comum, concernente ao tempo de duração do processo é bem perceptivo que nesta justiça especializada o tempo de duração é substancialmente menor.
Na fase de conhecimento, tanto no Juizado Especial, quanto no Federal o tempo de duração do processo até sentença é de 9 meses, enquanto que até a baixa é de 1 ano. Já na execução até a sentença é em média de 10 meses, sendo que na justiça federal é um pouco menor que na estadual. Já se for considerada a execução até a baixa é de 8 meses e meio.
Figura 8 - Tempo de Duração do Processo nos Juizados Estaduais e Federais, tanto na fase Conhecimento como na Fase de Execução
Figura 9 - Tempo médio de duração dos processos
Um outro dado importante é o tempo médio de duração dos processos ao longo dos anos, na vigência do Código de Processo Civil de 1973 (2015) e também com o Novo Código de Processo Civil.
Verifica-se que pela análise do gráfico o tempo médio do acerto diminuiu em quase 1 ano de 2015 para 2021, assim como o tempo médio do processo baixado diminuiu em 5 meses, caindo de 2 anos e 8 meses para 2 anos e 3 meses. A contrário sensu, o tempo médio de um processo até a sentença subiu em 7 meses desde 2015, saindo de 1 ano e meio e indo para 2 anos e 1 mês.
Uma outra análise diz respeito ao tempo médio da petição inicial até a sentença de segundo grau e primeiro grau. Na figura 10 a seguir é possível observar que enquanto no primeiro grau leva-se uma média de 2 anos e 3 meses, no segundo grau esse tempo é reduzido para aproximadamente um terço: 10 meses. Ou seja, o processo na fase de conhecimento demora mais, todavia, apesar da fase de execução ser mais rápida, esse tempo pode ser prejudicado pelas dificuldades na execução e constrição patrimonial que ocorre nessa fase.
Figura 10 - Comparativo do Tempo médio da inicial até a sentença no segundo grau e primeiro grau, justiça estadual, do Trabalho e Federal.
Custo do Processo
Um dado extremamente relevante para análise econômica das empresas é o custo do processo ao longo do tempo. No tópico anterior foi levantado o tempo médio de um processo, identificando-se que processos do Juizado Especial, em regra, tem os menores tempo de duração.
O tempo para todas as empresas tem implicações significativas, isto porque, quanto mais demorado é um processo, maiores os custos vinculados ao mesmo, seja porque os valores de condenação sofrerão reajustes em virtude da correção monetária e aplicação de juros, seja porque necessitará de um sistema cada vez mais robusto para fins de manutenção do acervo, ou até mesmo maiores custos vinculados com equipe de profissionais da área que necessitaram de mais tempo com os processos.
Um estudo de 2017 realizado pelo escritório Amaral, Yazbeck Advogados intitulado de Custo das Empresas Para Litigar Judicialmente”, identificou que 81,5% do volume de ações em trâmite são de responsabilidade das empresas, com base em dados do CNJ.
Ainda de acordo com o levantamento, em média, as empresas gastam R$ 157,38 bilhões de reais por ano com processos no Brasil e cada processo judicial envolve cerca de 94 mil reais em gastos.
A pesquisa revelou também que cada empresa tem uma quantidade anual de 6,57 processos, mas esse número pode chegar a 152,7 quando olha para as grandes empresas. São elas, inclusive, as responsáveis pela maior parte dos litígios, 53,47%, seguidas pelas médias, 24,37%, e então pelas micro e pequenas empresas, 22,6%.
Números como esses têm impactos diretos no faturamento de empresas de todos os tamanhos, mas são as micro e pequenas as mais afetadas. Segundo o estudo, os efeitos da litigância e seus altos custos acabam por comprometer em média 2% do faturamento. No caso das menores, esse percentual é de 2,08%. Médias e grandes comprometem 1,9% e 1,95%, respectivamente.
Após a mudança do Código de Processo Civil que permitiu no art. 85, §11º a majoração de honorários, viu-se eclodir uma mudança significativa na mentalidade das empresas, no concernente a forma de administração dos seus acervos jurídico.
O que outrora era a conduta comum, qual seja, a utilização de recurso infindáveis para somente e após esgotar todas as instâncias ocorrer o pagamento, numa total mudança de cultura e baseada muito nas questões econômicas, as empresas passaram a adotar mais a prática da conciliação e somente recorrer nos casos típicos de chances de vitória.
CONCLUSÃO
A evolução histórica do Processo Civil no Brasil, ao tempo que fez melhorar a nossa cultura processual, fez também evoluir significativamente o número de ações judiciais no país. Essa explosão de ações judiciais, sendo mais de 80% delas tendo uma empresa em uma das suas pontas, fez surgir e cada vez mais ter uma atenção sobre a análise econômica do direito nas litigância por parte das empresas.
Assim como as empresas são as maiores demandantes do Poder Judiciário Brasileiro, os seus acervos representam um importante custo nas operação e conforme estudo apresentado acima, chega-se ao percentual de 2% do faturamento só com a manutenção do acervo jurídico.
Esse evolução de custos para as empresas necessita de análise pormenorizada de como reduzir esses custos, sem necessariamente abrir mão de receitas e a análise econômica das decisões empresariais no ramo jurídico é de extrema importância, seja para manter a competitividade empresarial, seja para efetuar as melhores escolhas alocativas de gestão do acervo.
Do dados trazidos é ululante que o Novo Código de Processo Civil foi um divisor de águas nas decisões empresariais, porque ao mesmo tempo que implicou em maiores custos para maior tempo de processo, fez as empresas mudarem suas estratégias com o objetivo de diminuir esses mesmos custos. Aliado a novidade dos métodos alternativos de resolução de conflitos, o NCPC criou as bases sólidas para que as empresas, na gestão dos seus acervos jurídicos, utiliza-se da análise econômica do direito para tomada de decisão.
REFERÊNCIAS
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